30 agosto 2007

O pecado de Darwin - John Darnton

Troquei o "Gente Independente" por este livro, como leitura de férias, porque achei que o ambiente gélido islandês não combinava com as praias algarvias onde eu iria estar, por isso fui contra a teoria da grande filósofa Ana Pinheiro que me alertou que as grandes obras deviam ser lidas nas férias, quando estamos mais disponíveis para pensamentos profundos, teoria com a qual eu sempre concordei mas que nunca pus em prática. Acontece que não peguei no livro durante toda a minha estadia pelo sul, porque felizmente ou infelizmente não houveram tempos mortos. Quando regressei e supostamente deveria começar a estudar afincadamente para os exames que tenho em Setembro é que me viciei completamente no livro, passando praticamente noites inteiras acordada, só para devorar mais um capítulo que jurava ser o último que iria ler nessa noite, mas que nunca era. Resumidamente, o livro é um género de "Código Da Vinci" (é incrível a quantidade de vezes que uso este livro para o comparar com outros) onde o herói não é tanto um Indiana Jones, mas mais um Sherlock Holmes moderno onde o Dr. Watson é um rapariga jeitosa, ou seja, é um daqueles livros que se lê muito facilmente, que de certo modo nos envolve, mas que quando terminamos não nos deslumbra como talvez esperaríamos, deixando-nos até um pouco indiferentes.
Gostei de conhecer algumas das personagens que fizeram a viagem mítica com Darwin no Beagle e de revisitar Londres, especialmente Greenwich, que, aquando da minha última visita à capital inglesa, adorei conhecer. De resto não tenho mais nada a apontar, excepto, mais uma vez, as imensas gralhas de impressão. Será que não existem revisores nesta terra?

15 junho 2007

O Homem ou é tonto ou é mulher - Gonçalo M. Tavares

Primeiro BIS neste blog e não é por acaso que calha ser o Gonçalo M. Tavares. Acho que me apaixonei perdidamente pela escrita deste homem e agora está-me no sangue ler tudo o que consigo arranjar dele. Este exemplar em particular foi bem difícil de encontrar o que faz com que o considere uma verdadeira pérola. Fiquei tão contente quando finalmente o consegui comprar que até bati palminhas quando o Sr. da barraquinha da feira do livro me disse: "De facto está em ruptura de stock, mas ainda tenho aqui alguns." - por vezes perco o medo do ridículo, o que, é claro, é muito bom. Talvez não seja o livro indicado para primeiro livro a ler do GMT, mas que é simplesmente genial, é! Em apenas 80 páginas, rimos, dançamos, reflectimos sobre a vida e suspiramos lá para o final. Deixo-vos apenas com o pedaço que podemos ler na contra-capa, mas que descontextualizado, não tem metade da piada:

"Mas não julguem que não penso.
Eu sou é um pensador doméstico.
Fecho-me em casa e penso muito.
Quando venho cá para fora é que começo a disfarçar.
(...)
É muito difícil ser inteligente com tanta rapariga bonita a passar."


Diz-se por aí que irá sair uma nova edição, já com algumas modificações que o autor quis fazer...

22 maio 2007

Kafka à beira-mar - Haruki Murakami

O Independent apelidou-o de "Viciante", o Daily Mail de "Maravilhoso" e o The Times de "Hipnotizante" mas o melhor romance de 2005, intitulado pelo New York Times, teve sérias dificuldades em cativar-me. O primeiro capítulo fez-me torcer o nariz, não me agarrou, por assim dizer, o segundo começou a puxar por mim, mas durante as primeiras 300 páginas perguntei-me várias vezes se valeria a pena ler 50 capítulos do género. A sorte é que estava decidida em ir até ao limite da minha paciência, que felizmente é muita, e lá pelo meio fiquei agarradinha e deixei de fazer interrupções de 100 em 100 páginas para ler outro livro (comecei-o a ler antes do "Nem tudo começa com um beijo"). Curiosamente, as mesmas primeiras 300 páginas que não me fascinaram por aí além são as 300 páginas mais... mais "normais" (há que dar uso a esta palavra, diria o Branco) - à excepção de um velhote que fala com gatos e de uma quantidade de putos que desmaia numa montanha, nada de realmente estranho acontece. Quando a coisa começa a azedar e aparecem Johnnie Walkeres (Uísque) e Coronel Sanders (KFC) caídos sabe-se lá de onde, por estranho que pareça, e de facto é do mais estranho a que já assisti, foi quando o livro começou a entusiasmar-me e nunca mais o larguei.
Desta vez não vou passar nenhuma frase que tenha gostado (não é que não tenham existido), mas acontece que com esta história ficam mais imagens bem gravadas na memória (a biblioteca da Sra. Saeki, o frigorífico do JW, a cabana no meio da floresta, etc.), do que propriamente frases filosóficas interessantes, por isso vou-me restringir a copiar o que está escrito na contra-capa que só depois de ter terminado o livro fez completo sentido para mim:

"Sou livre. Fecho os olhos e penso com toda a minha força na minha nova condição, ainda que não esteja bem certo do que significa. Tudo o que sei é que estou completamente sozinho. Desterrado numa terra desconhecida, como um explorador solitário sem bússola nem mapa. Será isto a liberdade? Não sei, confesso, e às tantas desisto de pensar nisso."

... e porque o livro é sobre a liberdade, posso finalmente dizer, gostei. Além disso, sempre deu para conhecer mais um pouco da misteriosa cultura nipónica que, cada vez mais, tenho curiosidade em aprofundar.

PS: Não é que me desagrade totalmente esta nova editora (Casa das Letras) mas as gralhas ao longo do livro são mais que muitas. Não é que tenha encontrado erros ortográficos graves, mas conjunções quer repetidas quer fora do lugar, sílabas a menos ou a mais, etc. Na página 268 há uma frase que não percebi e pergunto-me se é ignorância minha ou mais alguma lacuna na impressão portuguesa.

22 abril 2007

O Véu Pintado - W. Somerset Maugham


Num total de 284 páginas, gostei efectivamente de ler umas 20. Eu que ando sempre a dizer que O Fio da Navalha é um dos grandes livros da minha vida, lido no longínquo ano de 1994, começo a pensar que só me marcou porque na altura eu era uma teenager.
Amigos que leram/releram O Fio de Navalha recentemente continuam a dizer que é uma excelente história, mas quanto a esta, não há muito a dizer. Além do estilo do próprio escritor que não é dos que mais gosto, a "libertação" de uma senhora fútil e a suas viagens, físicas e psicológicas, não me interessaram minimamente e mesmo assim consegui chorar a meio! Uma vergonha, bem sei, mas sou geneticamente de lágrima fácil.
Estava a planear ler o livro para depois ver o filme, mas começo a ter dúvidas que vá desembolsar 5€ para o ver... só se for mesmo pelos actores.
Da leitura célere deste livro, guardo unicamente 3 frases interessantes, que me fizeram lembrar várias conversas que tive recentemente:

"Só alcançarás o que queres, quando tiveres deixado de o desejar (...)" (pág. 207)

"(...) a única coisa que nos permite olhar este mundo em que vivemos sem asco é a beleza que, de vez em quando, os homens fazem brotar do caos." (pág. 229)

"(...) se por vezes é preciso mentir aos outros, é sempre deplorável mentir a si própria." (pág. 243)

26 março 2007

No Reino da Dinamarca - Alexandre O´Neill

Numa tarde de estudo na Biblioteca D. Dinis, assisti inesperadamente a um evento intitulado Viver a Poesia, onde se pretendeu comemorar o Dia Mundial da Poesia juntamente com o Dia Internacional da Mulher. Vários poetas ligados ao concelho de Odivelas recitaram alguns dos seus poemas, a maioria, obviamente, dedicados ao sexo feminino, e no final, quem quis, pode provar que todo o português tem alma de poeta.
Ultimamente têm-me perguntado várias vezes porque concordo com a existência de um Dia Internacional da Mulher e eu lá puxo de armas e bagagem para argumentar a importância de dias de sensibilização como o 8 de Março. Deixo agora um desafio a todos os que me deram nas orelhas por eu orgulhosamente comemorar o dia da Mulher: Porque raio é que existe um Dia Mundial da Poesia? Porque descriminamos o verso face à prosa? De facto é a primeira vez que escrevo sobre poesia num post deste Blog... credo... é por causa de gente como eu que houve necessidade de se criar este dia! Bem, para me redimir, e porque por mim não há mal nenhum em existir o Dia Mundial da Poesia, apesar de ser chato ser no mesmo dia da árvore pois uma pessoa fica indecisa entre plantar um castanheiro ou chorar enquanto lê Florbela Espanca, deixo-vos a referência a um dos meus livros favoritos de poesia, com especial destaque para este velho poema, que à medida que o tempo passa, e é verdade que o tempo passa, gosto cada vez mais:


TOMA LÁ CINCO!

Encolhes os ombros, mas o tempo passa...
Ai, afinal, rapaz, o tempo passa!

Um dente que estava são e agora não,
Um cabelo que ainda ontem preto era,
Dentro do peito um outro, sempre mais velho coração,
E na cara uma ruga que não espera, que não espera...

No andar de cima, uma nova criança
Vai bater no teu crânio os pequeninos pés.
Mas deixa lá, rapaz, tem esperança:
Este ano talvez venhas a ser o que não és...

Talvez sejas de enredos fácil presa,
Eterno marido, amante de um só dia...
Com clorofila ficam os teus dentes que é uma beleza!
Mas não rias, rapaz, que o ano só agora principia...

Talvez lances de amor um foguetão sincero
Para algum coração a milhões de anos-dor
Ou desesperado te resolvas por um mero
Tiro na boca, mas de alcance maior...

Grande asneira, rapaz, grande asneira seria
Errar a vida e não errar a pontaria...

Talvez te deixes por uma vez de fitas,
De versos de mau hálito e mau sestro,
E acalmes nas feias o ardor pelas bonitas
(Como mulheres são mais fiéis, de resto...)

Alexandre O'Neill

21 janeiro 2007

Cemitério de Pianos - José Luís Peixoto

Clap clap clap! Muitos parabéns ao autor por ter criado esta pérola. Há muito que não lia um livro que me desse tanto prazer em virar cada uma das suas páginas para tentar perceber todas as questões que ficam no ar com o decorrer da narrativa. Durante os primeiros capítulos cheguei a pensar que o livro seria um género de "Cem anos de Solidão" onde ficamos a conhecer ao pormenor três gerações de uma mesma família, e apesar de existir alguma verdade nisto, o busílis deste livro transcende, em muito, o género citado.
Enquanto estava para aqui a tentar escrever algo de jeito sobre esta obra, lembrei-me que por vezes é possível comparar um livro a uma figura geométrica: há histórias que decorrem em fórmula circular, outras são baseadas em triângulos amorosos, mas, a meu ver, esta história assemelha-se ao algarismo oito – ou ao símbolo do infinito - como preferirem (depende se são mais para o vertical ou horizontal) talvez provocado pelo travo presente a David Linch , que me agradou, e pelo jogo narrativo declarado que me entreteve bastante e fez-me lembrar o saudoso “Bolor” do Augusto Abelaira.
As personagens do enredo são complexas e cada uma interessante a seu modo, especialmente a personagem Simão que, como já era de se esperar, é a cereja no topo do bolo.
Por último, devo dizer que concordo plenamente com o Vasco Graça Moura quando diz:

"Creio estarmos perante um grande ficcionista e, também, um grande prosador da língua portuguesa, capaz de extraordinárias notações do real, de ritmos inovadores e até de uma relação estrutural com as formas musicais que não tem precedentes entre nós."

De facto, esta narrativa assemelha-se a uma vasta obra musical, onde se reconhecem andamentos distintos e ritmos opostos alternados, onde identificamos musicalidades diferentes e tipos diversos de linguagem.
Fiquei fã! Leiam.